John Evan
Os seus olhos eram dramáticos e, naquela hora da noite, eles estagnavam-se sobre o papel-creme borrado por algumas letras escritas em lápis grafite. Gostaria de entender o porquê nada emergia do seu espírito; gostaria de entender o porquê, acometido por um vazio indizível, ele sentia seu corpo imóvel e sua mente um deserto. Não era mais capaz de transcrever suas estórias terríficas e sanguinolentas? Para onde fora a sua ânsia pelo caos que faz pensar no quão efêmera é a vida? Noites em claros e papéis borrados, John Evan proferia a si mesmo o silêncio amargo de um bloqueio de escritor. Algo mórbido jazia no ínfimo de sua criatividade. Pensou em levantar-se do chão frio, fechar a janela para impedir que a chuva entrasse em sua alma, no entanto a dor da incapacidade era tamanha que pesava o suficiente para impedi-lo de agir.
Ele gostaria de estar pensando; antes sua mente estivesse cultivando um verdadeiro cenário apocalíptico do que estar em tal abismo-precipício. Até mesmo os seus olhos, agora trágicos, hesitavam em realizar o movimento instintivo do piscar. Pálpebras cansadas não ousavam repousar. O nada tomava conta do espaço vital, o cômodo ali era pequeno e recheado de livros por toda a parte, o pouco espaço que sobrava era o chão onde ele estava sentado e, além dos livros, havia a cama que, em algum lugar estava. Incompreensível e incompreendido por si mesmo naquela decadente situação, pela intuição exigia respostas, seu corpo começou a tremer.
Inicialmente, suas mãos tremiam como se ele estivesse ébrio há dez dias e ele bem sabe como é esta situação, pois há alguns anos ele muito se perdia no álcool em busca de inspiração. Após a queda da sua capacidade de amar. O tremor era como a embriaguez, a overdose de álcool. O organismo pedindo socorro. Socorro por quê? Para quê? Para quem? Ele estava sozinho, até mesmo as palavras sumiram. Os traços, os rostos, o pessimismo, a dor, tudo se foi.
Nem o suicídio se fazia manifesto em sua trágica possibilidade.
Foi então que ousou deixar-se tomar conta daquele vazio, deixou-se tremer sob a luz morna e fraca de seu quarto. Não lutaria mais contra o inevitável. Permitiu-se ouvir o que sua alma vociferava. Ele esperava morrer, esperava um ataque cardíaco ou um início de síndrome do pânico, contudo a única coisa que acontecera, certamente, o surpreendeu de tal modo que o fez sorrir.
Ele caiu em prantos, no choro mais verossímil. Soluços, lágrimas, cachoeiras e um sorriso. Tocou seu rosto e imediatamente inundou suas mãos. Olhos embaçados e o gosto saldado lacrimal sobre os lábios. Finalmente estava permitindo-se ser si mesmo, em seu puro desespero íntimo e singular.
Sara Melissa de Azevedo
Enviado por Sara Melissa de Azevedo em 15/11/2016