Se o fado eterno rege a lei altíssima*
Decerto deve haver atroz — malíssima ! —
Ventura então traçada em minha mão
De modo que ao crepúsculo a sanção
Enquanto eu me encontrava felicíssima
Punira-me co'a noite em gris arpão
Fincado ao centro d'alma, ó, languidíssima!
Foi quando aos céus-negror ela emergiu
E a prata-lume aos vultos afligiu
Deixando no horizonte um esplendor
De face tanto argêntea em vil fulgor
Eu vi da mi'a janela que se ungiu
Do pálido luzir versicolor
De encanto o meu semblante se tingiu…
— Quão belo! Que estupor inebriante!
Devora-me silente… angustiante! —
Clamei como menina em devaneio
Sequer notei que a aragem contraveio
Cingida à névoa lôbrega pulsante
M'ia tez a arrefecer — Demais receio…
Receio estar co'a mente delirante… —
A névoa fez-se breu tão densamente
Gemi mortificada e confidente
Pois nela reslumbrante olhos-palor
Serenos conduziram-me em pavor
Um grã pavor tão mórbido que ardente
Causava-me um enlevo inconsequente
Até se dissiparem sem pudor
Deixando-me amargura decadente
Querendo me afogar em seu horror.
❖ Escrito por: Sara Melissa de Azevedo
❖ Pintura de: Ambrogio Antonio Alciati
❖ Leia Sara Melissa de Azevedo em saramelissadeazevedo.com, incentive a escrita da autora em Apoia.se e conheça o seu livro mais recente: Sete Abismos. Sara Melissa de Azevedo é escritora e poeta de estilo gótico, lírico e profundo; sua arte literária é inspirada nos clássicos, tais com Edgar Allan Poe, Camões e Bram Stoker. Formada em Psicologia, Sara Melissa de Azevedo se inspira também na Filosofia e na Daseinsanalyse, alguns de seus filósofos preferidos são: Heidegger, Schopenhauer, Sartre e Edmund Husserl. Conheça mais da autora clicando aqui.